Desde o início da produção dos trailers -- que data do ano de 1912, com a série "What Happened to Mary?" (EUA), de Charles Brabin (produzida nos estúdios de Thomas Edison), como mostra o documentário "Coming Attractions: The History of the Movie Trailers" (EUA, 2006) – duas coisas não costumam mudar: 1) as produções são exibidas anteriormente à película que o espectador optou por assistir na sala do cinema, e 2) o intuito é fazer um breve resumo da sequência dos filmes (não necessariamente seguindo a mesma ordem de imagens que será apresentada originalmente). O objetivo é, nesse caso, apenas um: aguçar em quem assiste a vontade de conhecer mais essas outras histórias.
Essa maneira pela qual buscamos conceituar os trailers também representa o padrão ao qual estão submetidas as produtoras. Elas enxergam no trailer uma forma de divulgar seus filmes para o público. Tal estratégia, como qualquer outro tipo de publicidade, também está sujeita a gerar resultado contrário ao esperado, fazendo com que muitas vezes o público, no ato de assistir a determinados trailers, imediatamente passe a não admirar seus respectivos filmes. Muitas vezes o espectador vê o trailer antes mesmo de ler a sinopse referente ao mesmo, recebendo a ideia geral do filme num “pré-conceito” mal construído.
Por isso, é preciso, mais do que tudo, capacidade de síntese para poder transmitir a essência do filme num pequeno intervalo (geralmente de 30 segundos a 2 minutos e meio) que desperte a atenção do espectador dentre toda a enxurrada de trailers que é posta para ele na tela. Para não nadar e morrer na praia, depois de uma produção cinematográfica que demanda um montante de capital, os produtores temem ultrapassar as barreiras do modelo clássico de trailer com medo de serem mal recebidos pelo público a que se destina. Essa dificuldade de fugir da práxis ocorre em todas as esferas artísticas, como a discutida por Vilém Flusser, por exemplo, na fotografia, em seu livro Filosofia da Caixa Preta.
Tomando a teoria de Flusser e ampliando-a para todo o universo das imagens, fica simples explicar porque essa reação ocorre. Basicamente, Flusser teoriza sobre a dificuldade do fotógrafo (produtor de imagens) de construir uma imagem que fuja dos modelos pré-concebidos pelo software, pois o programa já vem inserido nos aparelhos (máquinas fotográficas, câmeras de vídeo, computadores, etc).
Segundo o autor, para que consigamos quebrar o padrão e alcançar a verdadeira liberdade de criação devemos “jogar contra o aparelho”. Isso se faz possível a partir do momento em que conhecemos a fundo todo o funcionamento do programa, e então nos tornamos capazes de ultrapassar suas barreiras e branquear a caixa-preta (nome dado por Flusser ao sistema que opera os aparelhos).
Um trailer que é capaz de cumprir com o seu papel, ou seja, divulgar a ideia original de um filme e, ao mesmo tempo, atrair seu público sem ser transmitido da forma padrão, é um vídeo que consegue quebrar com o modelo programado. É o caso do trailer do longa-metragem espanhol de terror REC (2007). Se assistimos ou não ao filme, se o trailer é “legal” ou não, tudo isso não vem ao caso. O interessante é como ele nos chama a assistir sem sequer nos mostrar uma imagem da película. Ele busca nos convencer a ver o filme através da exibição das verdadeiras sensações de quem já o assistiu na sala do cinema. São imagens de espectadores sentados em uma sala do Festival de Sitges (Festival de Cinema Fantástico da Catalunha, Espanha), em que o filme foi exibido e as reações das pessoas foram gravadas.
Vitória C. J.
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